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Como o Bagaço da Cana-de-Açúcar Está Revolucionando a Construção Civil Sustentável no Brasil

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A indústria da construção civil brasileira está prestes a testemunhar uma revolução verde. Pesquisadores transformaram um resíduo agrícola abundante em material de alto valor para edificações sustentáveis, prometendo reduzir custos e impactos ambientais.

De acordo com informações da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), um grupo de dez pesquisadores conseguiu desenvolver uma sílica inovadora a partir das cinzas do bagaço in natura da cana-de-açúcar. Esta descoberta abre portas para uma nova era na construção sustentável brasileira.

O Que Torna Essa Inovação Diferente das Demais

O bagaço da cana-de-açúcar, tradicionalmente queimado para cogeração de energia ou descartado, agora ganha status de matéria-prima nobre. A pesquisa da UFRN demonstrou que as cinzas deste resíduo podem gerar sílica de alta qualidade através de um processo inovador e economicamente viável.

Luciene da Silva Santos, coordenadora do Laboratório de Tecnologias Energéticas (Labten) onde os testes foram realizados, destaca que este é um grande resultado para o uso renovável de matéria-prima no país.

A sílica obtida pode ser utilizada em diversos produtos industriais:

  • Tintas e revestimentos de alta performance
  • Cosméticos e produtos de higiene
  • Fabricação de pneus automotivos
  • Filtros de purificação de água
  • Aplicações na indústria petrolífera

Como o Bagaço Se Transforma em Material de Construção

O processo desenvolvido pelos pesquisadores brasileiros utiliza uma rota tecnológica diferenciada. José Alberto Batista da Silva, professor e ex-aluno do Programa de Pós-graduação em Química da UFRN, explica que a sílica do bagaço de cana, denominada “sílica MP2”, pode servir como suporte para processos de adsorção de compostos de enxofre no diesel.

Além da produção de sílica, estudos demonstram outras aplicações do bagaço na construção:

Tijolos ecológicos: A combinação de cinza do bagaço com resíduo de cerâmica vermelha cria tijolos com propriedades pozolânicas, gerando novos silicatos e aluminatos de cálcio hidratados.

Blocos construtivos: Pesquisas indicam que blocos de bagaço de cana-de-açúcar com solo atingem resistência de 2,6 MPa na compressão e 2,1 MPa na flexão, adequados para vedações não estruturais.

Concreto melhorado: A cinza do bagaço refina os poros do concreto, reduz danos externos e fortalece suas propriedades pozolânicas, podendo substituir parcialmente o cimento.



Vantagens Competitivas Para a Indústria da Construção

A adoção do bagaço da cana-de-açúcar como material de construção traz benefícios tangíveis para empresas e construtoras:

Redução de custos operacionais: O uso de materiais de baixo custo no processo de síntese diminui significativamente os investimentos em matéria-prima.

Menor consumo energético: A tecnologia desenvolvida requer menos energia para produção comparada aos métodos convencionais.

Isolamento térmico superior: Blocos com alta quantidade de fibras de bagaço proporcionam isolamento térmico substancialmente maior que tijolos cerâmicos tradicionais, comparável ao concreto leve com cânhamo.

Sustentabilidade certificável: Painéis à base de bagaço reduzem a desflorestação em até 35%, contribuindo para projetos com certificação LEED.

Propriedades técnicas aprimoradas: Materiais apresentam durabilidade elevada, resistência à umidade e propriedades retardadoras de fogo.

Impacto Ambiental e Econômico da Inovação

A transformação do bagaço em material de construção resolve dois problemas simultaneamente: destina adequadamente um resíduo agrícola e reduz a pegada de carbono da construção civil.

O Brasil produz milhões de toneladas de bagaço de cana anualmente. Ao invés de simplesmente queimá-lo para energia, este resíduo pode agregar valor social e econômico aos compósitos de construção.

Estudos apontam que a substituição parcial do cimento por cinzas de bagaço pode reduzir a pegada de carbono em até 20%. Considerando que a produção de cimento é um dos maiores emissores de CO2 do planeta, esta redução representa um avanço significativo.

A reciclagem desse resíduo industrial também:

  • Viabiliza o uso de sistemas pré-fabricados de construção
  • Possibilita a reutilização do material ao final do ciclo de vida do edifício
  • Reduz a necessidade de extração de recursos naturais
  • Diminui emissões de gases poluentes comparado a blocos forneados tradicionais


Perspectivas e Desafios Para o Futuro Próximo

A tecnologia desenvolvida pela UFRN está classificada no Technology Readiness Level (TRL) entre três e quatro, numa escala que vai até nove. Isso significa que a inovação ainda precisa avançar etapas de maturação antes da produção industrial em larga escala.

Luciene Santos sinalizou que há necessidade de escalonamento para uma produção em planta piloto de até um quilo e, futuramente, em escala industrial. Este processo requer investimentos em infraestrutura e testes de viabilidade econômica ampliada.

O mercado global de materiais à base de bagaço de cana está em expansão. Projeções indicam crescimento a uma taxa de 6,5% ao ano até 2030, impulsionado pela demanda por produtos ecologicamente corretos em embalagens e construção.

Para construtoras e empresas do setor, acompanhar o desenvolvimento desta tecnologia pode significar vantagem competitiva futura. A adoção antecipada de materiais sustentáveis posiciona empresas favoravelmente em mercados cada vez mais conscientes ambientalmente.



Por Que Essa Descoberta Importa Para o Setor

Esta inovação representa mais que uma solução técnica isolada. Ela exemplifica como a economia circular pode transformar desafios ambientais em oportunidades de negócio.

Para o setor da construção civil brasileiro, historicamente dependente de materiais convencionais intensivos em carbono, o bagaço da cana-de-açúcar oferece um caminho viável para sustentabilidade sem comprometer qualidade ou viabilidade econômica.

A convergência entre disponibilidade abundante de matéria-prima, tecnologia nacional desenvolvida e crescente demanda por construções sustentáveis cria um cenário promissor para a adoção desta inovação nos próximos anos.

Profissionais do setor que acompanharem de perto os desenvolvimentos desta tecnologia estarão melhor posicionados para aproveitar as oportunidades que surgirão à medida que a produção em escala industrial se torne realidade.

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